A
palavra luto deriva do latim “luctus”, que significa “dor, pesar, aflição”.
Apesar de ser na sua maioria das vezes associada apenas à reação perante a
morte de um ente querido, o luto engloba também outro tipo de perdas, como
separações familiares, o fim de uma relação amorosa ou a perda do estatuto de
pessoa saudável devido ao diagnóstico de uma doença grave.
Perante
o diagnóstico de cancro, o doente entra habitualmente num processo de luto pela
perda da sua funcionalidade e autonomia, dos seus sonhos e esperanças e de um
futuro com os seus entes queridos (Rando, 1986). Quando a doença progride até
ao momento em que não existe a possibilidade de cura, o doente oncológico e os
seus familiares enfrentam também um luto antecipatório, que diz respeito ao
total de reações cognitivas, afetivas, sociais e culturais a uma morte esperada
(Knott & Wild, 1986; Rando, 2000). Aqui, o doente terá que se adaptar a uma
série de mudanças emocionais, sociais, espirituais, físicas, cognitivas e
comportamentais, designadamente, reconhecer e adaptar-se às múltiplas perdas,
pensar constantemente sobre o passado, desvincular-se da família e amigos e
passar por períodos de tristeza, choro ou ansiedade (Periyakoil &
Hallenbeck, 2002). Por sua vez, a família deverá partilhar entre si conhecimentos
sobre a realidade de uma morte próxima e a experiência da dor do luto (Rosen,
1990). Além disso, a família fará nesta altura uma reorganização do sistema
familiar e os seus objetivos serão também redirecionados.
O
luto é vivenciado pelas pessoas de diferentes formas, na sua expressão e
duração. Contudo, a literatura sobre o tema sugere que a maioria dos indivíduos
demora entre um a dois anos a recuperar do processo de luto – considera-se que
este processo foi bem resolvido quando a pessoa enlutada consegue falar no ente
querido sem sentir dor, reajustar-se a um ambiente do qual o falecido já não
faz parte e estabelecer novos vínculos com outras pessoas (Parkes, 1971; Stroebe,
Stroebe & Domittner, 1988; Worden, 2003). Além disso, no período de um ano
o indivíduo enlutado passa por todas as festividades e acontecimentos
significativos na família (ex. aniversários, Natal, Páscoa, entre outros), pelo
que habitualmente a pessoa não recupera o seu funcionamento habitual num
período de tempo inferior a este.
Em
suma, as reações ao luto são muito diversas e a maioria das pessoas não
regressa à normalidade num período inferior a 12 meses. Além disso, e
principalmente na doença oncológica, o processo de luto inicia-se muitas vezes
antes da morte efetiva, pelo que as pessoas necessitam de tempo e espaço para
se adaptarem a uma nova realidade. Aqui, os profissionais de saúde têm um papel
preponderante, ao avaliarem a necessidade de um acompanhamento psicológico e/ou
psiquiátrico ao doente e/ou aos seus familiares.
Por Susana Carvalho
Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, Estagiária Profissional na Unidade de Psico-Oncologia da Liga Portuguesa Contra o Cancro - Núcleo Regional do Norte.
Referências:
Knott, J., & Wild, E. (1986). Anticipatory grief
and reinvestment. In T. Rando (ed.), Loss
and Anticipatory Grief (pp. 55-60). New York: Lexington Books.
Parkes, C. (1971). The first year of bereavement. A
longitudinal study of the reaction of London widows to the death of their
husbands. Psychiatry, 33, 444–67.
Periyakoil, V., & Hallenbeck, J. (2002).
Identifying and managing preparatory grief and depression at the end of life. American Family Physician, 65, 883–890,
897–898.
Rando, T. (1986). A comprehensive analysis of
anticipatory grief: perspectives, processes, promises, and problems. In T.
Rando (ed.), Loss and Anticipatory Grief
(pp. 3-37). Massachusetts: Lexington Books.
Rando, T. (2000). Anticipatory mourning: what it is
and why we need to study it. In T. Rando (ed.), Clinical Dimensions of Anticipatory Mourning: Theory and Practice in
Working with the Dying, their Loved Ones, and their Caregivers (pp. 17-50).
USA: Research Press.
Rosen, E. (1990). Families
Facing Death: Family Dynamics of Terminal Illness. Massachusetts: Lexington
Books.
Stroebe, W., Stroebe, M., Domittner, G. (1988).
Individual and situational differences in recovery from bereavement: a risk
group identified. Journal of Social
Issues, 44, 143–58.
Worden, J. (2003). Grief
counseling and grief therapy: a handbook for the mental health practitioner.
New York: Brunner- Routledge.